ENTREVISTA COM RUI MANÉ ( Director de Bateria da Costa de Prata )



ENTREVISTA COM RUI MANÉ- DIRECTOR DA BATERIA DA BI-CAMPÊA DO CARNAVAL DE OVAR. ( Escola de Samba COSTA DE PRATA )






Nome e idade ?

Rui Miguel Rodrigues Mané, 35 Anos.

Como foi o teu início nestas andanças pelo samba?

Em terra de carnaval como é Ovar, inevitavelmente participei nos desfiles em grupos infantis desde muito cedo, mas o que realmente me atraia e fascinava era o som das baterias das Escolas de Samba. Desde muito cedo demonstrei interesse em participar, tinha familiares na E.S. Costa de Prata, aos quais pedi para poder ingressar, mas só me foi possível ingressar em 1994.

Qual o teu trajecto como sambista ?

Como referi anteriormente, comecei na E.S. Costa de Prata em 1994 (onde ainda permaneço). Comecei por tocar caixa, e fi-lo durante 10 anos! Ainda em 2003 a escola forma o Grupo de Pagode Costa de Prata, do qual fiz parte e onde toquei tan-tan. Em 2005 assumo o comando da bateria e passo para o surdo de terceira. Em 2010 ainda vou a tocar repique, mas a partir de 2011 passo apenas a dirigir a bateria.

Como vês o atual momento da Costa de Prata como bicampeã do Carnaval de Ovar e vencedora do Trofeu Nacional de Samba?

Vitórias trazem motivação, reconhecimento mas acima de tudo responsabilidade!
Como já referi em entrevista anterior, os títulos não são o meu foco principal! São sem dúvida o reconhecimento da dedicação e trabalho realizados pela direção, grupos de trabalho e de todos os elementos da escola, mas não são eles que definem a evolução da escola. Dou sempre como exemplo o ano de 2014, em que a escola não ganha o carnaval, fica em 3º Lugar, mas ganha sem dúvida o grupo, pois a escola uniu-se mais que nunca e até tem 40 novos elementos que entram para o ano seguinte.
A escola teve uma “injeçao” de sangue novo, com a entrada de uma nova direção, com um misto de juventude e experiência, com novas ideias e com muita vontade de fazer! Temos crescido nos últimos anos tanto quantitativa como qualitativamente! A abertura da escola à comunidade com a realização do concurso de destaques, o concurso de samba enredo, a Summer Week e agora também o concurso de maquetes, tem permitido a escola crescer. Crescemos como grupo, como escola e como associação! Atravessamos um bom momento, com um grupo bastante unido, somos uma verdadeira família e isso torna-nos ainda mais fortes. Vencemos o Troféu Nacional de Samba e sagrámo-nos bicampeões do Carnaval de Ovar, ambos marcos importantes para a escola, uma vez que foi algo nunca antes alcançado pela Costa de Prata. Mas isso não nos retira o foco nem a humildade! Cabe-nos a nós Direção, manter o crescimento sustentável da associação e o bem-estar de todos os nossos associados, para que possamos continuar a ser a grande família Costa de Prata. São as pessoas e o seu bem-estar que nos movem.


Quando assumiste a direção da bateria da Costa de Prata?

Assumi a direção de bateria da E.S. Costa de Prata em 2005.

Como vês o atual momento da bateria da tua escola?

Tal como toda a escola, também a bateria tem evoluído e atravessa um bom momento! Não é por acaso que vencemos o quesito bateria há três anos consecutivos! Temos evoluído tecnicamente a nível da execução, cadência e afinação. O aumento do número de elementos na bateria tem contribuído para que possamos consolidar os naipes existentes e também para a introdução de novos naipes como o chocalho e o agogô. Temos um misto de pessoas já experientes com pessoas muito jovens e que entraram para a escola sem saber tocar nenhum instrumento, o que tem sido um desafio para nós. No entanto, a amizade existente, a coesão do grupo, a vontade de aprender, de fazer mais e melhor tem-nos permitido superado todas as dificuldades. Somos um grupo de amigos e isso facilita em muito o nosso trabalho.

Quais ou qual a característica mais marcante da bateria da Costa de Prata?

Penso que a característica mais marcante da bateria da Costa de Prata é a sua coesão, uma bateria sem grandes individualidades, sem nenhum destaque em particular, mas forte como um todo. Admiro a evolução feita pela bateria na cadência, afinação e precisão na execução. Não posso deixar de destacar os chocalhos e os agogôs que muito influenciam a sonoridade da bateria no momento.


És "adepto" de que tipo de paradinhas( bossas ) em uma bateria ?

No geral gosto de paradinhas, desde que encaixem no samba e que não sejam demasiado exageradas, têm que permitir que o samba respire. É um gosto pessoal, mas não sou muito adepto de bossas com muitas batidas diretas de pergunta resposta, gosto mais de bossas cadenciadas, com variações rítmicas, com evidenciação do surdo de terceira e tamborins.

O que é para ti uma boa bateria de escola de samba?

Olho para uma bateria de escola de samba como uma orquestra, onde todos são importantes e onde cada um tem a sua função bem delineada. Gosto de sentir todos os naipes sem atropelos e com sonoridade suave. Para mim uma boa bateria é aquela que respira, que tem boa afinação, que executa na perfeição e sem agressividade e de preferência que arrisca no grau de dificuldade das suas bossas.

Normalmente em que altura iniciam os ensaios com vista ao Carnaval?

Os ensaios para o carnaval começam no início de Setembro, numa primeira fase para a preparação dos concursos de destaques e sambas enredos. Após os concursos, Outubro, ensaiamos todas as semanas até ao Carnaval.

Durante o período pós Carnaval ensaiam com que regularidade?

Logo após o Carnaval, se não existirem atuações agendadas, ensaiamos uma vez por mês. Entre Abril e Julho ensaiamos de 15 em 15 dias à sexta à noite e/ou sábado à tarde.



Quais as maiores dificuldades sentidas pela tua escola de samba ou/e em geral pelas escolas de Ovar?

Falando apenas pela minha escola, acho que a maior dificuldade é a disponibilidade da maioria dos elementos da escola para estarem presentes o ano inteiro. Muitos elementos apenas vivem a escola com intensidade nos meses pré carnaval, esmorecendo o interesse nos meses seguintes.
Em relação às escolas em geral, e dando apenas a minha opinião pessoal, a grande dificuldade está em captar os jovens para as escolas de samba. Ovar é uma cidade que respira carnaval, mas aqui o samba é uma parte muito pequena. O forte continuam a ser os grupos carnavalescos, onde a sua grande maioria apresenta qualidade, o que desperta o interesse dos mais jovens, aliado á maior descompressão existente, pois desfilar numa escola de samba exige mais esforço, muito mais ensaio, maior responsabilidade e muito menos “brincadeira”.

Como ves o actual momento do Carnaval de Ovar relativamente as escolas de samba ?

Neste momento vejo com alguma preocupação o panorama das escolas de samba em Ovar, pelo que já referi anteriormente e também por alguns acontecimentos que tem marcado algumas escolas em Ovar. A saída de muitos elementos das escolas faz-me temer a sua redução de qualidade ou até mesmo a sua extinção. Isso não seria bom nem para o samba nem para o Carnaval.


Relativamente ao concurso em Ovar no Carnaval que opinião tens sobre os critérios de avaliação, dos jurados e votação e justificativas dos mesmos?

Ser jurado é muito ingrato, não existe a figura daquele que irá conseguir agradar a todos, pois nunca será unânime, a opinião é sempre muito pessoal. É um pouco como as leis, se ela for clara e exata, é muito fácil, é só olhar e julgar de acordo. Mas não é assim, e em Ovar existe a agravante de não ser dada a justificativa da nota. Já foi sugerida inúmeras vezes mas não foi aceite.

Como tens visto a evolução das escolas de samba em Portugal?

Bem, não posso fazer juízos de valor sobre a evolução das escolas de samba em Portugal, pois não faço o acompanhamento de todos os carnavais do País para o poder fazer. No entanto, e dos poucos que acompanho, como escola de samba no seu todo, acho que todas elas têm evoluído positivamente, mas na minha opinião, as escolas de samba de Estarreja são as que têm dado passos maiores na evolução como escolas de samba, isto no aspeto de maior parecença com o Rio de Janeiro. Em Ovar, as escolas de samba apresentam uma evolução significativa nos vários quesitos, mas no que se refere a fantasias apresentam uma evolução diferente, pois não seguem tanto a linha do Carnaval Carioca, mantendo as linhas carnavalescas locais.



Para ti quais as escolas que mais tem evoluído em Portugal no geral de todos os quesitos?

Na minha opinião, Sócios da Mangueira, Vai Quem Quer, Trepa Coqueiro e Costa de Prata.

A nível de bateria quais as que mais tem evoluído na tua opinião? E quais as que mais admiras?

Para além da Costa de Prata, que tem apresentado uma evolução significativa, para mim a bateria que mais tem evoluído é a dos Sócios da Mangueira, sendo uma das que mais admiro, juntamente com a Vai Quem Quer e o Trepa Coqueiro.

No Brasil quais são as tuas preferidas?

No Brasil gosto de todas, cada uma com a sua característica. No entanto consigo destacar claramente das restantes a Salgueiro, Portela, Ilha, Grande Rio e Estácio de Sá.

A nível nacional que mudanças ou evoluções gostarias de ver acontecer para melhorar o nível das escolas de samba e dos seus desfiles?

Penso que a criação da Liga das Escolas de Samba de Portugal era de extrema importância para a evolução do samba em Portugal, existir um denominador comum entre todas, alinhar ideias e traçar o caminho para que todas possam evoluir e caminhar no mesmo sentido. Criar sistemas de votação iguais para todos os carnavais, para que todas as escolas possam seguir as mesmas diretrizes. Criar um evento nacional, à semelhança do Mega Samba, mas não virado só para as baterias, tentar a presença de personalidades do Carnaval Carioca e proporcionar workshops em várias áreas, por exemplo costura, alegorias, adereços, samba no pé, etc.

Concordas com os moldes em que é realizado é disputado (quesitos e jurados que estão a concurso) o TROFÉU Nacional em Estarreja?

Não concordo por vários motivos. O principal é sem dúvida as votações, não é por ter ganho o troféu no último ano que a minha opinião vai mudar! E aqui a criação da Liga das Escolas de Samba teria um papel fundamental conforme referi na questão anterior. Não devem ser as escolas participantes a escolher os jurados. Porque não pegar em pessoas de outras escolas que não estão a concurso e com conhecimentos em cada quesito e colocá-las como juradas?
Outra das injustiças prende-se com a realização do troféu sempre na mesma cidade, não estando à partida todas as escolas em pé de igualdade, pois estando mais perto é muito mais fácil colocar um número maior de elementos a desfilar, e isso faz toda a diferença.


Como analisas as rivalidades existentes entre as escolas de samba em Portugal? E como gostaria que fosse a ideal convivência entre elas?

Hoje em dia considero que já não existe rivalidade. A rivalidade que tem que prevalecer é aquela que considero saudável, nos dias dos desfiles onde todos querem dar o seu melhor. Passando a linha do fim de desfile, todos devemos ser amigos e respeitar o trabalho de cada um. A partilha de conhecimento é cada vez mais uma constante, o convívio entre escolas e a participação nos festivais de samba cultiva a aprendizagem e sobretudo a camaradagem entre todas as escolas. Se assim não for, não estamos cá a fazer nada.

Quais os teus momentos mais felizes no samba ? E os menos felizes?

Felizmente é muito difícil escolher os momentos mais felizes no samba, pois para mim todos os momentos passados no samba são momentos felizes. Consigo destacar o meu primeiro desfile, em 1995 e a minha entrada para a direção de bateria da Costa de Prata em 2005! Destaco também, talvez por ser o meu maior desafio e por isso também um dos momentos mais felizes, que foi pegar em 23 mulheres da escola e formar uma bateria feminina para fazer a abertura o espetáculo de apresentação dos sambas enredos no Espaço Tenda em Ovar (2010).
Momentos menos felizes, não me consigo recordar de nenhum.

Obrigado pela tua colaboração .Abraçaço e muitas felicidades para ti e para a Costa de Prata